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.................OU SEJA, UMA CONCORDÂNCIA IDEOLÓGICA....................................................................................................

terça-feira, junho 24, 2008

o artifício do fogo


Tudo o que vejo limítrofe ao meu canto
só prolonga a escuridão.
E eu queria queimar os olhos
com surpresas.
Emagreço os contrários
para equilibrar os invernos
e as chuvas que caem só pontualmente me molham.
[
O que vou escrevendo
sempre antecede os últimos pensamentos
]
Volto. Volto por método
dois passos à frente de onde me perdi.
Sei de um lugar
onde brotam malmequeres espontâneos
que se colam, gavinhando, à verticalidade
com que escrevo a vida.
[
Legitimo a urgência
: queria
queimar os olhos com surpresas
]


Conservo intacta a taça onde me embriago.
[
A sede é uma simplificação que o corpo inventa
]

quinta-feira, junho 19, 2008

a tua luz


sempre a noite
a amplificar
pois que lhe é fácil
enunciar em luares os lábios nus
os teus
os teus que os meus sonham
roubados
não falam
antes calam desejos
alados que me percorrem
por todos os lados
enluarados de beijos
a inventar
luares distantes
crus

sempre a noite
a encharcar-me o pensamento
de ti
que te trago alucinado
de lua - um raio
que penduro no tecto
do meu silêncio

o firmamento
luar de sentimento
derrama a tua luz
em mim

sábado, junho 14, 2008

criativa dúvida


| mais importante do que obter respostas, é nunca parar de fazer perguntas | mjm



      não me respondas
nunca à primeira pergunta
que em cascata precipitas em torrente
muitas outras em permuta
      a cada resposta dada
nova dúvida é levantada
infinitamente insaciável é a nascente sem rotura
      a procura
      a eterna procura é fungo que fermenta
a criativa dúvida
é nascente da torrente
mãe fecunda
      pergunta e resposta são reflexo
espelho impressionado no convexo
desfocando tudo
o que o desejo perpetua
      entende em quem pergunta
o que procura
mas não forneças nunca o álibi
pois cessas
na promessa da resposta
a demanda à criatura

sexta-feira, junho 13, 2008

Frágil


Frágil
na tua mão deponho o dia
e mais o resto que de mim não perdi
Repara
há um sorriso que não usei
pendulando num fio de cabelo
que apanhei
escondido
atrás do quotidiano

sexta-feira, junho 06, 2008

latidos


Uma apatia dispersa
paira entre lua e rua
Só o pensamento vagueia
perambulando latidos de cão vadio
O mundo inerte despido
palavra alguma sussurra
E eu nasço na leitura de um poema
         Vazio vazio
         Só e o vazio
Aumenta o eco o latido
do meu desejo vencido
         Pena pena
         Só e a pena
É ralo e raso o que prende
- conta-me errando o errante -
embora pensando o aumente
- o que penso não se move -
- o que digo não se ouve -
Cão algum se surpreende
enquanto ando
de sema em sema
esgotando o silêncio ao real
Há um mal estranho agarrado às horas
         na hora vadia
         só e vazia
que me larga entre lua e rua
Latindo à apatia
- estrutural –

sexta-feira, maio 30, 2008

ser poeta


sai o verbo das gramáticas
quando lido
e ganha novos sentidos
como quando
destes dedos
a vontade se desprende
e a verbo rende
esbaforidos
cada um e todos
os mais recônditos sentidos
frase a frase
letra a letra
sem ponto ou vírgula que submeta
limite ou pausa
e ensaie sôfrego
o impulso solto
de pela escrita o escravizar
a uma vontade incontrolada
de ser palavra
a correr louca
pára se alcança o orgasmo
o espasmo
de ser poema em tua boca

quarta-feira, maio 28, 2008

clonagem - manufacturas


incartografável
o homem
saiu de si
abandonando-se
das lágrimas
avulsamente polinizado
a nenhum sítio pertence
lugar algum o reclama

a geografia humana será mapeada
até que o sal a seque

terça-feira, maio 27, 2008

clonagem


a geografia humana será mapeada

________ incartografável ________

[
(o homem)
saiu de si
( ~ abandonando-se ~ )

a nenhum sítio pertence
lugar algum o reclama

( \ avulsamente polinizado )
]

até que o sal
( ~ das lágrimas ~ )
a seque

sexta-feira, maio 23, 2008

escrevo para pensar


diz-se que escrevo
para poder pensar mas
o que penso escrever escreve apenas
sem que diga o que penso e
o pensamento a descrever se faz

diz-se que digo da escrita
para poder dizer mas penso que escrevo apenas
sem que diga o que escrevo e
o pensamento ao dizer desfaz

se alguma coisa me prende
desprende-se o pensamento nela
e a escrita vai atrás dele sem nela mais se apegar
por isso escrevo por ela
por isso largo atrás dela pensamento escrita à vela
para dizer que se escrevo é apenas para pensar

diz-se que escrevo e não digo
penso o que escrevo e prossigo
se penso que o consigo duvido e volto ao mesmo lugar
nenhum pensamento é abrigo se a meta é escrever sem pensar

digo que escrevo e não penso
que a cada novo começo ela me foge ao pensar
escrever é mero pretexto de fazer de cada texto
um pensamento um lugar

quinta-feira, maio 22, 2008

s/título


Não há objecto que fale por mim
Em contrapartida
sou objecto da minha fala
Adorno o espaço que o meu silêncio sempre ocupa
Na decadência da luz
qualquer sombra nos absorve

quarta-feira, maio 21, 2008

labirinto


Depois de decifrado
o labirinto
enrolei metros de recta
para descobrir que
deliciosos
eram os ângulos!…
Então
divertida
como criança
que seriamente brinca
devolvi-a à sua real importância
: reintegrei-a
num labirinto
. E repousei
a contemplar a obra reparada.

sábado, maio 17, 2008

.deslocalização.


                          nenhuma urgência no mundo
                  depende de
                              um poema

                          nenhuma urgência no mundo
                  é já por si
                              um poema

quarta-feira, maio 14, 2008

desejo suave


experimento a barbárie
de um desejo suave
há nele uma superioridade
de dedos supérfluos

se a escrita desliza fica por conta própria
qual líquido escorrendo
a desaguar na memória dos dias

no mais
é sempre a morte a repetir-se
a incendiar as cinzas
ao espólio do pensamento

terça-feira, maio 13, 2008

olhar para trás


Não estavam já ali. Talvez
    a ausência
os tivesse chamado para outros lugares
para outros pomares. Talvez
    a memória
essa arrecadação de polpas
    do paraíso
os tenha atraído à maçã primordial.

sábado, maio 10, 2008

ó poeta estranho


Não. Não me vejas só
por mim. Nem só. De mim
um crânio sobrará. E ossos. Como
os que quando escrevo
vou quebrando. O crânio
por duro
inteiro se observará
não tanto quanto só quebrando
o escrevo. Não. Nem só.
Deste ser que escreve nem um só
osso eu conheço. Mas sinto-lhe a carne
e quebro-me quando
a cada frase escrita
se solta um osso. O crânio
me dita ao doer nele a ossada
de cada palavra mais ousada.
No mais
estou só. Em mim sem corpo.
Na escrita entrecruzada.